Você tem Ética? Artigo por Flavio Farah
Estamos em 1990. Você é Gerente de Produção de uma indústria têxtil. A exemplo de outras empresas brasileiras, sua companhia é protegida da competição interna e externa pelo aparelho regulador de preços, pelo fechamento da economia e pela legislação de reserva de mercado. Assim, vocês obtêm lucros elevados, apesar de utilizarem tecnologia obsoleta, apresentarem baixos índices de produtividade e operarem com custos altos.
Em março, Fernando Collor assume a Presidência da República e inicia a desregulamentação, privatização e abertura externa da economia. A diretoria de sua empresa então percebe que, se algo não for feito rapidamente, a companhia não resistirá ao ataque dos produtos importados e fechará as
portas.
Os dirigentes decidem, então, modernizar a linha de produção a toque de caixa. Eles encomendam
na Alemanha teares de última geração para substituir as velhas máquinas que a empresa utiliza há
mais de 20 anos. Os novos equipamentos, por terem controle totalmente eletrônico, exigem que o
operador tenha nível de instrução mais elevado e treinamento específico. Seus tecelões, que operam
os teares, felizmente possuem o nível de instrução necessário. O treinamento operativo é fornecido
gratuitamente pelo fabricante.
O fornecedor alemão lhe pede para indicar com antecedência os nomes dos operários que participarão
do treinamento. Os que não forem treinados não serão capazes de operar as novas máquinas.
Como não há outro lugar para eles na empresa, terão que ser demitidos. O que você teria feito? Você
teria se apressado em dar os nomes de seus tecelões ao fabricante sem pensar duas vezes, assim
que recebesse a solicitação?
Se você respondeu sim, então você não tem Ética.
Como?! Não tenho Ética, eu?! Mas por quê?!
Porque você não respeita a liberdade das pessoas.
Como assim ???
Você teria inscrito os tecelões sem lhes perguntar se eles queriam participar do treinamento.
Você está brincando! Para que perguntar? É claro que todos iam querer! Quem não fizesse o treinamento seria demitido! O melhor para eles era fazer o treinamento! Só um louco não ia querer!
Louco por quê? Talvez houvesse alguém que quisesse ser despedido para receber o FGTS e abrir
um negócio próprio. Talvez existisse alguém com vontade de voltar para sua cidade de origem.
Poderia haver alguém que simplesmente não aguentasse mais ser tecelão, com ou sem modernização.
Ora, que idiotice!
É assim que as pessoas autoritárias pensam. Elas sempre acham que sabem o que é melhor para
os outros porque pensam que os outros são incapazes. Você não pensa nos tecelões como pessoas
que possuem ideias, sonhos, desejos, interesses e objetivos próprios. Você pensa neles como
ignorantes, como pobres-coitados que sempre precisam que alguém lhes diga o que fazer.
Você não tem respeito por eles.
Você está querendo dizer que eu sou autoritário e que por isso não respeito os outros?
Sim. Mas não fique chateado. Você não está sozinho. Todos nós, brasileiros, somos autoritários.
Alguns mais, outros menos. Vivemos em uma sociedade autoritária. O indivíduo autoritário considera
que as pessoas não são iguais. Algumas são “superiores”, por isso têm mais direitos e merecem
mais respeito, enquanto outras, as “inferiores”, têm menos direitos e merecem menos respeito.
As pessoas autoritárias agem, freqüentemente, com falta de Respeito ou de Justiça. Sua
falta de Ética é causada por seu autoritarismo. Assim, se quiser agir eticamente, você terá que
pensar que todos têm a mesma dignidade, os mesmos direitos e merecem o mesmo respeito que
você. Em resumo, você terá que incorporar a ideia de que todos são iguais.
*Flavio Farah é Mestre em Administração de Empresas, Professor Universitário e autor do livro
"Ética na gestão de pessoas". Contato: farah@flaviofarah.com .